Por Frei Rodrigo da Silva Santos, ofm
Hoje (01/03), deu-se o início das atividades acadêmicas no Instituto Teológico Franciscano. Os estudantes, professores, conselho acadêmico e funcionários se reuniram no Salão Acadêmico para a tradicional abertura do ano letivo feita pelo Reitor, atualmente, Frei Sandro Roberto da Costa.
Frei Sandro iniciou com uma breve apresentação dos novos alunos do ITF na graduação em Teologia e do Master em Evangelização. Apresentou a todos os funcionários que zelam pelo bom funcionamento da estrutura acadêmica e o corpo docente da instituição. Comentou sobre a situação da filiação do ITF à Pontifícia Universidade Antonianum, de Roma, que vence neste mês de março após um período de 5 anos. Todo o processo tramita normalmente, e a renovação da filiação já é esperada.
A Aula Inaugural ficou sob a incumbência de Frei Marcos Antônio de Andrade, recém-chegado de Roma, onde concluiu seu mestrado em Liturgia no Pontifício Instituto Litúrgico Santo Anselmo. Frei Marcos discorreu sobre o tema de sua tese, baseado na SC 12, onde defende que a música deve ser vista como parte integrante e necessária da Liturgia. Segundo Frei Marcos, a música, quando integrada ao mistério litúrgico, tende a ampliar o horizonte simbólico do rito e, assim, permite ao homem o vislumbre do mistério divino. Ele concluiu afirmando que ela, quando se une ao rito, transforma-se em mistagogia. Música, Teologia e Liturgia, juntas, são reflexo da perspectiva humana frente a Deus.
Após a apresentação de Frei Marcos, todos se dirigiram à capela do Instituto onde celebraram a Eucaristia, consagrando a Deus este ano que se inicia, para que, com Ele, o ano transcorra bem e os temas de nossa Igreja e Teologia possam ser refletidos e aprofundados com sua devida dignidade.
Texto da homilia do reitor, Frei Sandro Roberto da Costa, na celebração:
"Se alguém tiver sede, venha a mim e beba... Quem crê em mim, do seu interior correrão rios de água viva"
Neste trecho do Evangelho, o Evangelista sublinha a necessidade de uma atitude interior prévia, para que alguém possa se aproximar da fonte e beber: se alguém tiver sede... Na atividade acadêmica, bem como em qualquer atividade humana, a sede deve ser o movente: como nos diz a música dos Titãs: você tem fome do quê? Você tem sede do quê? No estudo da teologia, mais do que uma disposição intelectual e racional, é preciso ter sede da "água viva", sede de conhecer a Verdade, de travar diálogo, de superar horizontes, de aventurar-se rumo ao desconhecido, que se nos descortina através da reflexão e da pesquisa. Diria até: é preciso ter fome: fome de conhecimento, fome de informação, fome de compreensão do ser humano, que no fundo é fome de compreensão do próprio Deus. O fato de nos dispormos ao estudo, à pesquisa, à busca da Verdade, já é um Dom de Deus.
"Se conhecesses o Dom de Deus, Ele te daria de ber da água viva..."
Esta parte do diálogo de Jesus com a Samaritana, nos recorda que Água Viva e dom de Deus são a mesma coisa: no Evangelho o verdadeiro Dom é o conhecimento da Verdade sobre Jesus.
A água viva, materialmente, designa a água de uma fonte, ou de um rio, em oposição à água parada, de uma cisterna por exemplo, que não se renova, que não refresca, e que pode até fazer mal. No pensamento de João, "água viva" é a água que jorra para a Vida Eterna. Na literatura profética, a água é símbolo da salvação e dos bens futuro que vêm de Deus. Jeremias 2,12s exclama: "Pasmai, oh céus, com isto! Espantai e abalai-vos profundamente - Oráculo do Senhor! Porque meu povo cometeu dois crimes: Eles me abandonaram, a fonte da água viva, para cavar para si cisternas, cisternas rachadas que não podem reter água". O livro dos Provérbios compara a instrução a uma fonte, de onde jorra a vida, em oposição à morte: "A instrução do sábio é fonte de vida, para evitar os laços da morte" (Pr 13,14).
Através do estudo da teologia, somos convidados a nos aproximarmos da Fonte, para crescermos num percurso de amadurecimento integral, numa relação harmônica entre vida intelectual e vida espiritual, entre estudo e contemplação, entre reflexão e ação pastoral. Num movimento dinâmico, ao mesmo tempo em que somos chamados a matar a nossa sede na fonte da Sabedoria e da Verdade, seremos preparados para indicar aos sedentos as veredas que conduzem à fonte de água vva, aos homens e mulheres que nos interpelam em busca de sentido para suas existências, sedentos de justiça, com sede da Verdade.
Neste início do século XXI, nós, estudantes e professores do Instituto Teológico Franciscano, somos diretamente interpeldos a dar uma resposta. Chamados ao diálogo, à abertura ao mundo, à sociedade, como lugar ordinário de nossa atuação, nossa resposta deve ser coerente com o lugar que nos é dado ocupar neste momento: uma resposta balizada pelo estudo, pela pesquisa, pela reflexão teológica, unindo nossos esforços aos esforços daqueles que acreditm na capacidade do exercício acadêmico como possibilidade de busca de soluções para transformar a realidade. Desafios como a complexidade do mundo urbano, da ética, da questão ambiental, do diálogo inter-religioso, exigem de nós respostas abalizadas. Por outro lado, inspirados pelo Evangelho e pela riqueza do carisma franciscano, não nos podemos furtar à premente tarefa da construção da solidariedade, da justiça e da paz, da defesa da vida onde quer que se encontre ameaçada, ao compromisso de colaborar com o crescimento do Reino de Deus, como servos de Jesus e anunciadores de seu Evangelho.
Questionamentos, angústias e inquietações não nos faltam. Às vezes somos mesmo "cisternas rachadas". Mas que não nos falte a paixão, a capacidade e a vontade de buscar respostas. Que nos deixemos inspirar pelo Evangelho; que nos espelhemos no exemplo dos grandes pensadores da Ordem Franciscana, e, sobretudo, que nos deixemos interpelar pelos desafios que um olhar atento à realidade nos propõe. Que nossas atividades neste ano de 2011 nos ajudem a dar mais um passo rumo a um crescimento pleno, a um amadurecimento integral, humano, intelectual e espiritual.
Inicia-se hoje uma travessia. Mas o sentido desta travessia não está na partida. Nem tampouco na chegada. A própria travessia é o sentido. E esta travessia precisa ser feita com paixão, com emoção, com sede. É um tempo precioso demais para ser desperdiçado. É dom e graça. E como todo dom, é também desafio e responsabilidade. É tempo precioso de preparação, treinamento, aprendizado dos segredos de uma profissão. Se o amar precede o saber, se lhe é necessário, como diz Rubem Alves, "... na profissão, além de amar tem de saber. E o saber leva tempo para crescer."
Não sejamos "cisternas rachadas". Que o Senhor, "fonte da água viva", nos guie neste ano, na saborosa aventura da construção do saber.
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